sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Sem título



Este é um texto que começa com uma gruta fechada. Não se pode estar na pele de ninguém, nem interpretar o mundo por uma visão pessoal. De regresso, as coisas partem pelo fim de onde se lançaram e de onde foram lançadas. Cada qual com seu resíduo nas mãos, cada qual caminhando com seu pó. As coisas não se põem em seu lugar; as coisas estão ali, redistribuídas em sua cena. Elas são produzidas por ajuntamentos e intensidades, que ora se expandem em força, ora se retraem em busca de seu refúgio.

Este é um texto sem estratagemas e floris. Dos livros, não se brotará nenhuma experiência. Das palavras, no entanto, reforçar-se-á uma expressão, que caberá no entorno de toda uma vida moldável no esforço de algum aprendizado que vá além. 

Este é um texto despretensioso em estilo. Não surtirá o dom, que se comunica pela sombra de cada tradutor. Não caberá à esperança dar abrigo ao que já foi dado no mundo e ao que não teve como partida o seu espetáculo maravilhoso. 

Este é um texto circunspeto sem incisão. Toda sutura transformar-se-á em vida vermelha nas veias. Nada será desvelado, se não estivermos engajados com o aprendizado do saber que se tira do Tempo. Tudo poderá se repetir, se não encararmos o Diverso como regra do Mesmo.­

Este é um texto onde o que foi centelha, hoje é o pequeno fazimento do trigo. Sem lugar no mundo, que colhe a plantação e se vê impedido de guardar o próprio lavor, e até secretamente. 

Este é um texto que se exaure e que se esvai. Em duração, com o vento. Para fazer sobreviver, ainda, a linguagem poética. Ora morta, em breve, reviva. 

{31/10/2014}